Amou tanto, tanto que doeu tanto. Optou pelo caminho que parecia ser mais fácil. Decidiu nunca mais sofrer e expurgou a dor até deixar de sentir. Até esquecer. Até não saber mais como sentir. Até não saber mais como sentir quase nada.
Volta e meia se deparava com as inconvenientes lembranças do sentimento enterrado. Às vezes vacilava, mas sempre conseguia colocar uma nova pá de cal.
Depois o tempo (sempre o tempo) foi diluindo qualquer boa lembrança do amor falecido, sobrou o medo e uma razão descabida, exagerada para tudo quanto fosse emoção. Mas foi como se nada de importante acontecesse, como um choque, se deparou novamente com a aflição e deleite de viver como quem está sempre pronto para te fazer sorrir.
Lembrou como é bom se doar de graça, dormir pouco mesmo tendo que acordar cedo, ceder sem sentir dor, mudar de opinião, admirar imperfeições, sorrir à toa, dormir suspirando, lembrar do outro pelo cheiro.
E ai vem um outro golpe, uma rastreira sem aviso prévio. Outra vez aquele buraco profundo que surge no chão, engole e leva para o vazio.
Doeu, dói. Não dava pra enterrar dessa vez. Não dava pra comprar um sapato, mudar de cidade, mudar o cabelo, pintar as paredes, mudar de profissão. Precisou assumir a dor, deixá-la transparecer no olhar, nos gestos, na boca do estômago. Como gente grande, que não mostra, mas também não esconde as cicatrizes.
Sem certezas, com as pernas fracas e ainda algumas mil lágimas atrás dos olhos, desistiu de desistir.
Deseja então, profundamente, no futuro fazer ou tentar se fazer feliz sem hesitar. Nem que seja só enquanto durar. Nem que seja até doer outra vez. E dói.....
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